A China tem vindo a desenvolver uma rede global de parcerias, funcionando como uma ferramenta para promover a cooperação institucional e multilateral. No seu discurso de Ano Novo de 2023, o Presidente Xi Jinping sublinhou que “A China de hoje é uma China de estreita ligação com o mundo”. Desde a criação da sua primeira parceria estratégica com o Brasil, em 1993, a China não só tem assumido novos compromissos bilaterais, como também reforçado os já existentes, expandindo-os para modelos de cooperação mais abrangentes.

Parcerias Flexíveis e Baseadas no Consenso

As parcerias estabelecidas pela China distinguem-se significativamente das alianças clássicas e convencionais, sendo moldadas pela sua cultura tradicional e pelo princípio de não-alinhamento. Ao contrário das alianças tradicionais, geralmente impulsionadas por interesses militares ou hostis e que exigem algum nível de alinhamento ideológico ou político entre os Estados envolvidos, a abordagem da China nas suas relações externas foca-se em parcerias bilaterais baseadas na igualdade, no respeito mútuo (sobretudo pela independência política), nos benefícios recíprocos e no desenvolvimento harmonioso. Estas parcerias são não-antagónicas, não exigem alinhamento ideológico e são orientadas pelo consenso. Max Weber descreveu o consenso como “algo que ocorre quando as nossas expectativas sobre o comportamento dos outros são realistas”, e é através deste consenso que as parcerias conseguem transformar essas expectativas em realidade.

As parcerias chinesas funcionam como instrumentos político-diplomáticos ad hoc, dinâmicos, consensuais e juridicamente não vinculativos, concebidos para estabelecer um quadro geral de cooperação flexível, bilateral e pragmático. O seu propósito é promover interesses soberanos estáveis e criar benefícios mútuos, segurança económica e desenvolvimento pacífico. Estes modelos de cooperação, feitos à medida, conseguem transformar diferentes formas de consenso numa “visão ampla de mudança” e alcançar “pontos comuns […] através da compreensão e de negociações”. São tão flexíveis e adaptáveis quanto as partes envolvidas desejarem, especialmente em comparação com as alianças tradicionais e convencionais.

Por exemplo, o número de projetos numa parceria pode aumentar ou diminuir; o âmbito, a natureza e os termos da cooperação podem ser ajustados; e o processo de implementação pode ser acelerado, desacelerado ou até suspenso, conforme os interesses nacionais, as políticas ou as prioridades internas das partes envolvidas. Esta flexibilidade permite que as parcerias chinesas acomodem e facilitem uma variedade de programas, proporcionando uma base versátil para que ambas as partes continuem a alcançar uma cooperação significativa. Além disso, essa flexibilidade garante que nenhuma parceria seja igual a outra, sendo cada uma adaptada às necessidades específicas dos seus intervenientes.

Para a China, estas parcerias oferecem uma plataforma estável e equilibrada para expandir e coordenar os seus interesses com outros países, ajudando a moldar “um ambiente internacional favorável à sua ascensão como potência global”. Além disso, permitem que a China se afirme como um actor internacional relevante e promova a sua visão global de construção de comunidades com um futuro partilhado para a humanidade.

O Fortalecimento dos Laços da China com os Países de Língua Portuguesa

Entre todas as parcerias da China, menos de 10 por cento não são classificadas como “estratégicas”. No entanto, a presença de descritores como “abrangente”, “cooperativa”, “para todas as estações”, “global” e “amigável” reflecte o alcance da cooperação e das relações bilaterais. A China e os países de língua portuguesa têm vindo a fortalecer continuamente os seus laços através destas parcerias. A Tabela 1 mostra as dinâmicas associadas ao estabelecimento e desenvolvimento das parcerias entre a China e os nove países de língua portuguesa, bem como a sua integração nos espaços económicos regionais.

Em 2024, todos os nove países de língua portuguesa já tinham estabelecido parcerias com a China, todas elevadas ao nível “estratégico”, o que ressalta a importância destas relações. Nos últimos dois anos (2023 e 2024), as parcerias da China com a maioria dos países de língua portuguesa fortaleceram-se significativamente, em particular com Timor-Leste e com os países africanos de língua portuguesa. Este reforço facilitou os fluxos de cooperação bilateral e promoveu a integração regional, sobretudo através do acesso a novos mercados e centros de produção.

Integração Económica através de Parcerias

Operando tanto de forma individual como em conjunto com a iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota”, estas parcerias não só contribuem para os planos de desenvolvimento nacional dos países de língua portuguesa, como também funcionam como mecanismos de integração económica, reforçando o seu papel nas respetivas regiões. As relações internacionais nunca são estáticas, e qualquer relação bilateral, incluindo estas parcerias, está em constante evolução. Por isso, continuam a ser instrumentos diplomáticos essenciais entre a China e os países de língua portuguesa. Com o desenvolvimento contínuo das relações bilaterais entre Portugal, Brasil, Timor-Leste e China, a Cimeira de Pequim de 2024 do Fórum de Cooperação China-África (FOCAC) marca o início de uma nova fase de modernização no contexto da cooperação Sul-Sul. Esta cimeira reforçou o valor das parcerias chinesas como ferramentas político-diplomáticas, oferecendo um quadro consensual, pragmático e cooperativo para desenvolver relações de benefício mútuo. A estratégia de longo prazo da China é, em última análise, a criação de uma comunidade de futuro partilhado com todos os países e regiões.

Os autores:

Francisco José Leandro é professor associado na Faculdade de Ciências Sociais e subdiretor do Instituto de Assuntos Globais e Públicos da Universidade de Macau. Doutorou-se em Ciência Política e Relações Internacionais pela Universidade Católica Portuguesa em 2010 e possui a Agregação em Relações Internacionais.

Li Yichao é investigadora assistente no Instituto de Estudos Africanos da Universidade Normal de Zhejiang. Concluiu o Mestrado em Direito, com especialização em Direito Civil Comparado, na Universidade de Macau em 2018 e obteve o doutoramento no Instituto para a Investigação dos Países de Língua Portuguesa da Universidade da Cidade de Macau em 2021. Entre 2021 e 2022, foi investigadora de pós-doutoramento no Centro de Estudos Internacionais do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa.

Texto / Francisco José Leandro, Li Yichao
Tradução para português / Conselho Editorial e Célia Wang Chuyue, Repórter da UM
Tradução para chinês / Davis Ip

Fonte: UMagazine Edição 30